O estresse do Brasil atual e as doenças de otorrino

O estresse do Brasil atual e as doenças de otorrino

O estresse e a ansiedade estão cada vez mais frequentes na nossa sociedade. Atualmente, com o nosso país passando por um momento de muito conflito, percebemos um aumento nos casos de doenças psicossomáticas e de doenças associadas a esses sentimentos. Quais problemas de saúde o estresse emocional pode trazer na área da otorrinolaringologia?

O sintoma mais comum que percebo estar relacionado ao estresse na minha área é a tosse. Aliás, tosse muitas vezes associada à sensação de sufocamento ou sensação de coisa presa na garganta. Muitas vezes ela aparece pela sua associação ao refluxo faringo-laríngeo, uma doença bastante comum hoje em dia. Esse tipo de refluxo ocorre devido a um problema de motilidade do esôfago e por uma incompetência dos músculos esofagianos que deveriam impedir que conteúdo do estômago retornasse para a laringe. Os principais sintomas são a tosse seca,  principalmente noturna e pela manhã; o globus faríngeo, que é uma sensação de coisa presa na garganta; e o pigarro. Também são comuns mal hálito, sensação de gosto amargo na boca, aftas e eventualmente dificuldade de engolir.

Ainda na região da garganta, eventualmente observamos pessoal que perdem a voz devido ao estresse. O mecanismo mais comum que leva a isso é a utilização errada dos músculos da garganta na hora de falar. Para falarmos, necessitamos de uma ação coordenada desses músculos levando a um fechamento completo das cordas vocais, ou seja, elas praticamente encostam uma na outra durante a vibração da fala. Em casos de estresse, pode ocorrer de as cordas vocais não se tocarem, deixando um espaço no meio delas, o que nós médicos chamamos de “fenda glótica paralela”. Daí a voz fica rouca e soprosa. É mais comum isso ocorrer depois de traumas emocionais mais intensos, como quando pacientes sofrem uma perda ou uma violência.

É comum que pessoas ansiosas, que tem aquela sensação de que alguma coisa pode dar errado a qualquer momento, apresentem quadros de contraturas musculares por todo o corpo. Locais comuns de tensão muscular são o músculo da mordida e os músculos do pescoço.

Quando há uma tensão muscular maior no músculo da mordida, o músculo masseter, o paciente pode ter sensação de dor na região da articulação temporomandibular (ATM). Essa dor pode irradiar para dentro do ouvido e o paciente nos procura achando que está com otite. Essa pressão muscular pode ser tão grande a ponto do paciente ter fratura de dentes.

Quando a tensão muscular pega mais o pescoço, o paciente pode ter tonturas. Existem algumas teorias diferentes que explicam o porquê disso ocorrer. Umas dizem respeito a receptores de tontura que existiriam na musculatura cervical, outras apontam para problemas osteocartilaginosos e outras falam em problemas relacionados ao fluxo sanguíneo na região. De qualquer forma, está bem estabelecido que uma musculatura cervical contraturada pode deixar o paciente com uma sensação de tonturas ao virar a cabeça para os lados ou para cima.

Um sintoma que costuma “aparecer” em pacientes ansiosos e estressados é o zumbido (tinitus). Escrevi “aparecer” entre aspas porque na maioria das vezes, quando associado ao estresse, o zumbido aumenta. Na verdade, sabemos que existe uma regulação neurossensorial do zumbido. Sabemos que quanto mais o paciente se preocupa com ele, mais o paciente percebe ele. Costumo dizer que quando o paciente olha para o zumbido, o zumbido olha de volta para o paciente. Sendo assim, muitos pacientes já tinham um pequeno zumbido que talvez passasse quase desapercebido no seu dia-a-dia, mas, quando em um episódio de estresse emocional muito grande, o paciente passa a perceber aquele mesmo zumbido muito mais alto.

Além das doenças acima, devo dizer que percebemos o estresse emocional como um fator causal para doenças infeciosas em geral. Na minha área de atuação, o mais comum é vermos casos de amigdalite e de faringite agudas. Isso pode ocorrer pela queda da imunidade do paciente em um estado emocional ruim, ou pela mudança dos hábitos do dia-a-dia, como piora da alimentação e piora da qualidade do sono. Outras infecções, como otites, laringites e até sinusites agudas em paciente com pré-disposição podem ter como um dos fatores causais o estado emocional do paciente.

Todas doenças mencionadas neste texto têm tratamento específico, mas devemos sempre ter em mente o fator estresse como causa. Tratar o estresse é muito importante. Em um momento em que o nosso querido Brasil passa por uma situação tão conflituosa, com ânimos exaltados e alguns com muita incerteza sobre o futuro, não se esqueça: para poder enfrentar qualquer situação que esteja pode vir, você deve estar bem. Cuide da sua saúde física e da sua saúde mental.

“As informações aqui colocadas são de caráter informativo. Cada paciente possui suas particularidades e deve ser avaliado e tratado de forma individualizada. Se você tem algum problema de saúde, procure um médico especialista.”

Dr. Henrique Gobbo
CRM – 117688 SP